19 de junho de 2011

Nostalgia | Antonio Prata


Antonio Prata, São Paulo, 1977, escritor.

O Antonio é filho do Mario, ambos são escritores e eu adoro lê-los! Atualmente interesso-me muito pelas crônicas rápidas e desenvoltas do primeiro. Sigo seu blog (Crônicas e Outras Milongas, que já esteve no Estadão e hoje esta no UOL) e gostei muito do projeto Amores Expressos que foi transmitido pela TV Cultura no qual ele era um dos autores enviado à Xangai para escrever.

Às 4as. feiras ele escreve no caderno Cotidiano da Folha de São Paulo e nesta semana sua crônica "Nostalgia" me falou ao coração. O legal de ler caras como ele é que escrevem coisas que a gente sente e pensa, às vezes tão parecido! Vamos ao texto?

A nostalgia não é um dos sentimentos mais em voga na praça. Talvez porque, como já escrevi noutra crônica, ela seja uma espécie de caldo Knorr emocional: um tempero artificial, mistura de esquecimento com saudade, que garante cor e sabor a situações que, quando vividas, lá atrás, nem foram assim grande coisa.
Há também, acredito, outra razão para a desvalorização da nostalgia: por voltar nossos olhos ao passado, ela atua como uma âncora, impedindo o movimento "para o alto e avante", direção na qual nos empurram os impulsos mais de acordo com o nossa época: a ambição, a ganância, a curiosidade.
Eu tenho cá minhas ambições, minha ganância, muita curiosidade, mas confesso que levo sempre no bolso dois ou três tabletes de nostalgia. Não por pensar que o passado seja melhor que o porvir -torço pelo contrário; acredito no contrário-, mas porque o passado é a matéria da qual somos feitos; é só o que temos. Se pudermos optar, melhor conservá-lo mergulhado em poesia do que protegido por naftalina, não?
Ao contrário do que alegam seus detratores, a nostalgia -pelo menos, a vertente que eu pratico- não é necessariamente uma visão empobrecedora da vida. Fellini nada em rios de nostalgia e, no entanto, ninguém pode acusar "Amarcord" ou "8 e «" de edulcorarem a infância, pode? A violência está lá, a confusão, o desamparo. Mesmo assim, tudo é belo, trabalhado pelas mãos do grande artista.
Pragmático leitor, sejamos nostálgicos! Se não estivermos um tanto bêbados, de vinho ou poesia, como sugeriu Baudelaire, a vida vira um mero trajeto do pó ao pó, com escalas por unhas encravadas e planilhas Excel. Sem um mínimo de trapaça no olhar, nada resiste a um exame mais apurado. Roma é uma gritaria em meio a ruínas. Napoleão, um baixinho nervoso. Marilyn, uma bêbada chata. Muito provavelmente, Fellini nunca teve um tio doido e narigudo que subiu numa árvore, os bolsos cheios de pedras, gritando "Eu quero uma mulher! Eu quero uma mulher!", até ser resgatado por uma freira anã. Por isso temos a arte, para isso a nostalgia; para transformar o Miojo sem graça de nossas existências em algo mais próximo das "fotos ilustrativas" das embalagens, enfiando douradas coxas de frango e tenros filés onde havia somente farinha de trigo e gordura vegetal hidrogenada.
Penso essas coisas todas porque, em algumas semanas, mudo-me deste apartamento. Agora mesmo, enquanto escrevo, percebo-me melancólico como o diabo, olhando as paredes ou os vasos da varanda como uma paisagem da janela de um trem.
Passei aqui uma década. Cheguei com 23 anos - um aparelho 3x1 que ainda rodava as fitas gravadas na adolescência-, saio com 33 - previdência privada e alguns fios de barba branca. Debaixo deste teto, escrevi quatro livros, briguei com um amigo, fiz as pazes, tive o coração partido e colei seus pedacinhos.
Aqui, reencontrei o amor, casei e daqui me mudo, para uma casa maior, como convém, com um quintal e um gramado, onde correrão meus futuros filhos e os rios de nostalgia que, em seu devido tempo, brotarão por entre as plantas.

Depois de ler a crônica me pus a pensar na nostalgia que, em geral, as mudanças provocam em nós e reescrevi o texto mentalmente substituindo pelos detalhes da minha vida....E você o que pensa sobre a Nostalgia?

Assuntos relacionados:

A lista dos 10 livros mais legais que a Milly Lacombe leu em 2010. Entre eles esta Meio Intelectual, Meio de Esquerda, do Antonio Prata, da Editora 34.

Projeto Amores Expressos: grupo de 16 autores brasileiros, de várias gerações, incumbidos de escreverem histórias de amor, cada um isolado numa cidade do mundo, servindo de cenário e inspiração para suas narrativas.

3 comentários:

Maria Lúcia disse...

Oi
Sou apaixonada pelas palavras
quem me dera saber escrever tão bem,
não sou muito de passado gosto
do presente.
Beijos...
Lúcia

Cláudia Oliveira disse...

Ola Lucia! Obrigada pelas visitas e pelos recadinhos sempre carinhosos! Eu estou aprendendo a viver no presente mas como o autor trago sempre um caldo knorr de lembranças no bolso! Bjos, boa semana!

Nanda Botelho disse...

Oi linda!!

Não sou uma pessoa nostálgica... Se há uma coisa a que sou desapegada é o tempo que passou. Estou sempre olhando aqui e para frente, acho que tem a ver com meu signo (áries) Sou uma espécie de abre alas do zodíaco rsrsr

Mas acho que lembranças são boas, as desagradáveis para nos fazer aprender e mudar, as boas para aquecer o coração.

Bjs!

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